quarta-feira, 1 de julho de 2009

Capítulo Sete – Descrevendo o indescritível

Apesar de todas as atitudes inesperadas de Lucas, Marina ainda se sentia inexplicavelmente apaixonada por ele, e também se sentia culpada pela forma que agiu com ele. Ela estava confusa, uma enxurrada de sentimentos, antes desconhecidos, havia inundado o seu coração, e Lucas era uma incógnita pra ela. Ela não sabia como agir, não sabia se havia feito a coisa certa ao ignorá-lo. E se ele jamais voltasse a procurá-la? Ela nunca se perdoaria por ter o deixado ir assim tão facilmente.

Marina estava sozinha em casa, e não conseguia nem de longe entender um pouquinho da personalidade de Lucas. Às vezes ele era gentil, às vezes grosseiro, agia de um jeito num dia e, no outro parecia nem ser o mesmo. Ele parecia ter várias personalidades, mas Marina nunca soube ao certo o que se passava com Lucas, sua única certeza era que o amava e que precisava estar perto dele, ainda que não fosse como ela realmente queria. Ela tinha que estar sempre com ele, sempre vendo ele, sempre perto dele, ainda que nem sempre fosse isso o que ele queria, ainda que na maioria das vezes ela só ficasse pior na presença dele, por ele parecer não compartilhar do mesmo sentimento. Mas pior que isso era quando ele dava certas esperanças a ela e logo em seguida as desfazia. Era como se ele gostasse de vê-la sofrer, era como se ele ficasse feliz cada vez que a via triste.

Como no dia em que Marina estava a caminho da creche. Estava um dia nublado, frio, não muito convidativo. Marina havia tomado um banho e saído de casa com o cabelo molhado, ela usava um jeans e uma jaqueta quente sobre uma camiseta azul-clara. No caminho, Lucas vinha no sentido contrário do outro lado da rua. Ela tentou não dar atenção, pois ele não havia falado com ela em nenhum momento daquela semana. Quando ele a notou do outro lado da rua, atravessou e foi em sua direção. Marina ficou meio apreensiva em falar com ele, mas ela não podia simplesmente ignorá-lo e passar direto – assim como ele costumava fazer – ela não conseguiria fazer isso. Ele parou em frente a ela, e lhe cumprimentou com um beijo no rosto.

- Oi Marina. – ele sorriu o sorriso preferido dela.

- Oi. – ela quase não respirava. Era incrível a influencia que ele tinha sobre as reações dela.

- O que você está fazendo por aqui?

- Eu tava indo buscar minha irmã...

- Ah sim, é verdade, ela fica na creche.

- É. E você?

- Eu tava indo ali no mercado, eu moro aqui perto.

- Legal.

- Sabe ali, aquela lanchonete, que fica naquela esquininha ali pra baixo?

- Sei.

- Então, eu moro ali. Vai lá qualquer dia.

- Ah claro. Qualquer dia eu apareço por lá. Mas deixa eu ir, que daqui a pouco eu me atraso pra buscar a Renata. Até depois. – Ele estava a convidando pra ir a casa dele? “Quem é você e o que fez com o Lucas? Por favor, não o devolva!” Marina pensou, brincando.

- Ok. Tchau Nina.

Marina desceu a rua que levava à creche, tentando recobrar o ritmo da sua respiração e de seus batimentos cardíacos que haviam aumentado enquanto ela falava com Lucas. Por mais que ele às vezes a tratasse mal, ela não conseguia não se derreter cada vez que estava próxima dele, ainda mais quando ele estava mais comunicativo, apaixonante.

Renata já estava esperando Nina, e elas saíram rapidamente da creche, voltando para casa. A rua era uma subida, e ao chegarem à esquina, viravam à esquerda. Quando elas viraram a esquina, Marina viu Lucas no mesmo ponto onde eles haviam se encontrado um pouco antes, agora ele voltava do mercado carregando uma sacola. Marina respirou fundo e tentou controlar sua felicidade em vê-lo novamente. Lucas parou novamente e falou com ela.

- Essa que é sua irmãzinha?

- É.

- Oi menininha! – Lucas falava com Renata. – Como é mesmo o nome dela? – perguntou para Nina.

- Renata.

- Oi Renata, eu sou o Lucas.

- Oi. – Renata respondeu baixa e timidamente.

- Que lindinha que ela é!

- É, ela não tem nada haver comigo. – Marina e Renata ao se pareciam em nada.

- Ela é linda que nem a irmã dela. – Lucas disse e saiu andando a caminho de sua casa.

Marina mordeu os lábios e se virou para ver Lucas indo embora, ele olhava para trás e sorria. Como ele conseguia ser tão inexplicavelmente apelativo para Nina? Ela poderia estar o mais zangada que fosse com ele, que com apenas um sorriso, ou nesse caso algumas palavras, ele já a fazia esquecer do porquê de ela estar triste com ele.

Mas nem sempre era assim. Lucas talvez tivesse algum problema ou quem sabe algo que o impedisse de estar com Marina, ou talvez não quisesse mesmo estar com ela, apenas gostasse de saber que existia alguém que sempre estaria disponível pra ele. Pois era assim que Marina aparentava estar, sempre disponível pra ele. Não que ela não estivesse, mas isso a prejudicava passava uma imagem de uma menina fácil, o que ela não era, ou não queria ser. Ela era uma menina incondicionalmente apaixonada por Lucas, o que a fazia ter medo de perdê-lo com qualquer atitude negativa que tinha com ele. Ela tinha muito medo. Medo de não o ver mais, de não mais falar com ele, de não mais estar com ele, isso seria insuportável pra ela naquele momento.

No colégio, Lucas era sempre indiferente com Marina, e quando se encontravam, por acaso, fora dele, Lucas era incrivelmente atencioso e educado, e amável e apaixonante com ela. O que a fez pensar que ele pudesse ter vergonha de falar com ela perto dos seus amigos, já que todas as vezes que se viam fora do ambiente escolar eles estavam sozinhos. Cada indício de uma possível reciprocidade que ele dava a ela numa tarde em que se viam, morria logo pela manhã quando ele simplesmente parecia não conhecê-la. Nem mesmo as prováveis aulas de guitarra foram o suficiente para voltar a manter aquela antiga aproximação entre eles no colégio.

Lucas não mais tentou ficar com Marina depois do dia em que ela virou o rosto quando ele foi beijá-la. Ela se arrependeu de ter feito isso, mas consentiu que talvez não fosse pra haver nada mais do que uma amizade entre eles, já que ainda assim ela precisava da sua dose diária de Lucas em sua vida. E foi assim, tentando manter uma amizade com Lucas, que Marina conviveu com ele nos dias que se seguiram. Muitas vezes era difícil, pois ele não dava a mínima importância a ela, o que a fazia extremamente triste, chegava até mesmo a chorar tardes inteiras enquanto estava sozinha em casa, tentando entender o porquê de ele agir daquela maneira. Ela nunca perguntou nada e ele, e nunca descobriu tal motivo. Talvez fosse o fato de parecer intrometida ou algo do gênero, talvez fosse o medo da resposta.

Até aqui você pôde ver que tudo que acontecia com Marina e Lucas sempre acabava da mesma maneira: ela triste a apaixonada, ele vivendo normalmente. A partir de agora tenho que admitir uma coisa: vai continuar assim. E essa pode se tornar uma história cansativa e repetitiva, e eu até entenderia se você parasse de ler agora, eu poderia até ajudar a ficar mais fácil:

“E assim Marina continuou sua vida apaixonada por Lucas e ele nunca se importando. Até que um dia ele percebeu que ela era o grande amor da vida dele, se declarou para ela e eles viveram juntos e felizes para sempre. FIM.”

Pronto, acabou a história. Mas eu estaria mentindo, e eu não estou aqui pra mentir, estou aqui pra relatar todos os fatos da vida de uma menina que teve todo o sentido de sua vida mudado quando conheceu um garoto esquisito e completamente diferente de todos os que já tinha visto e convivido, e se apaixonou por ele. E assim tentar descobrir até que ponto algo lhe faz bem e quando começa a lhe fazer mal. Tudo o que for escrito daqui pra frente, por mais inútil que possa parecer, é necessário para se poderem entender as atitudes de Marina, seus medos, seus desejos, seus sonhos, suas loucuras. Já adianto que “histórias de amor” nem sempre têm finais tão felizes como nos contos de fadas, mas se você quer mesmo saber como são os finais da vida real de uma garota real e um garoto real, sugiro que continue a ler. Caso contrário, pare aqui mesmo e acredite no final feliz, eles existem! Será até menos constrangedor para mim, simples narradora, que lhe propus uma história interessante e posso decepcioná-lo, leitor.

Se chegou até aqui e continua lendo, presumo que vá ir adiante. Então continuemos essa narrativa e vamos acompanhar o que essa paixão de Marina nos reserva. Desculpe-me os meus devaneios. Onde eu estava mesmo? Ah sim. Os medos e frustrações de Marina.

O tempo ia passando, e Nina ainda se via apaixonada por Lucas, mas ele sequer percebia. As amigas dela às vezes perguntavam se ela ainda gostava dele, mas ela respondia que não, que já havia passado, que agora eram apenas amigos. Ela podia mentir pra qualquer pessoa, menos pra si mesma. Ser amiga dele talvez tenha sido a pior opção pra Marina, se ela ao menos se afastasse dele, quem sabe poderia ser melhor para ela, quem sabe ela pudesse realmente esquecê-lo. Ela no fundo sabia que não era ela quem ele queria, e gostava demais dele para ser tão egoísta ao ponto de passar por cima das vontades dele para satisfazer as suas – na verdade Nina chegava a ser um pouco altruísta – e, por mais que não fosse com ela, ela apenas queria que ele fosse feliz. Mas nem sempre ela era tão pacífica assim, e nem sempre ele era tão alheio a ela assim. Houve vezes em que ele a provocava e ela se afastava, e vice-versa.

Marina havia encontrado um jeito de estar mais próxima de Lucas. Depois que descobriu onde ele morava, ela também soube que sempre passava na frente da casa dele pra ir ao colégio, e desde então começou a sair em horários diferentes cada dia para ver se em algum dele sela tinha a sorte de passar por lá justamente quando ele também estava saindo para o colégio. Um dia essa tática deu certo. Marina estava passando na frente da casa de Lucas, e ele saiu no mesmo momento. Ele a viu e pediu que ela o esperasse, virou-se, trancou a porta e caminhou em direção ao pequeno portão que os separava. Enquanto isso, ela rapidamente olhou o relógio do celular e viu a que horas ele saia de casa: 7h:15m. Talvez não fosse esse o horário que ele saia de casa todos os dias, mas ela decidiu estar por ali todos os dias mais ou menos nesse horário. Ele a cumprimentou com beijo no rosto, e foram caminhando lado a lado para o colégio. Não conversaram muito, apenas o normal para quaisquer pessoas educadas que estudava na mesma turma: “Oi, tudo bem?” “Estudou para aquela prova...” “Nossa, foi tão engraçado ontem...”. Assim foram mais alguns dias em que Marina conseguia ir junto com Lucas para o colégio, nenhum diálogo muito importante, mas pra ela, estar com ele já era mais que importante.

Numa segunda-feira, logo após a Páscoa, Marina havia ganhado além de ovos de chocolate, uma caixa de bombons, que resolveu levar para o colégio e dividir com suas amigas. No caminho, ela e Lucas foram juntos para o colégio, e ela lhe perguntou sobre como havia sido sua páscoa, apenas para manter uma conversa.

Já no colégio, durante uma aula de Química, a professora teve que ir atender a alguns pais de alunos de outras classes que queriam falar com ela, e deixou a sala sob a responsabilidade da inspetora, que apenas observava as conversas na sala. Marina, Patrícia, Fernanda e Mily estavam comendo os chocolates que Marina tinha trazido, e Lucas estava sozinho no fundo da sala. Marina, para chamar a atenção dele, pegou um bombom Serenata de Amor, e como na propaganda que passava na televisão, ela caminhou até ele com o bombom nas mãos, e disse:

- Serenata? – ela sorriu, um pouco provocando, um pouco envergonhada, oferecendo o bombom a ele.

- Eu não posso comer muito chocolate, meu café da manhã foi uma caixa de Bis! – ele se explicou.

- Uh, você é quem sabe. – ela abriu o bombom e o mordeu, enquanto ele apenas observava. Ela voltou para o seu lugar comendo o chocolate.

Chegando de novo ao grupo de amigas, Fernanda logo perguntou:

- Marina Becker! O que foi isso?

- Aii Fer, nada demais. Ele tava olhando lá sozinho e eu fui oferecer um chocolate pra ele. Só isso. Ele não quis meu Serenata. – “e pelo jeito nem a minha serenata, caso eu fosse louca o bastante pra isso” ela completou mentalmente.

- Ele não parou de babar em você um minuto! Ahhh Marina.... – as meninas riram.

- Nossa nada haver, vocês são todas maliciosas! – Nina acusou.

- Claro, foi bem a gente mesmo que foi lá provocar o menino. – Mily provocou Marina.

- Já disse que não tem nada demais entre eu e ele, somos apenas amigos – “Infelizmente” – e ele nem ficou “babando” em mim como vocês disseram, e eu não fui lá provocar ele! – “Ou fui? Gostei disso...” ela pensou.

Marina se interessou pela idéia de provocá-lo, ela não tinha notado, mas as meninas lhe disseram que ele havia ficado babando nela, e isso era bom. Mas dessa vez, foi um ato inconsciente, e das outras vezes, será que ela teria o mesmo resultado? Será que ela teria coragem o suficiente para provocá-lo, agora intencionalmente? Ela ainda era uma menina muito tímida.

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