quarta-feira, 1 de julho de 2009

Capitulo Cinco – Depois de quando?

Marina ficou envergonhada, ela não gostava de se expor no meio da rua. Lucas se despediu dela e foi embora. Ela ficou meio desnorteada, havia acabado de beijar o menino por quem estava obcecada, e o melhor, a iniciativa não havia partido dela, o que significava que ele também sentia algo por ela. Nina foi andando lentamente para a sua casa, ela mantinha os dedos nos lábios e relembrava o que havia acabado de acontecer. Era quase meio-dia, e o sol brilhava forte num céu azul, sem nuvens – dias bonitos eram difíceis de se ver em Curitiba, e aquele era um deles – e Marina observava o céu, e em como o dia havia ficado tão perfeito em tão poucos minutos. Andressa, uma colega dela que morava ali por perto, também estava voltando do colégio, e viu Lucas e Marina. Ela sabia que Marina tinha uma quedinha (quedinha?) por ele, e quando viu o que havia acontecido, ficou feliz pela amiga, e a alcançou:

- O que foi isso que eu acabei de ver? – perguntou Andressa, sorrindo e cutucando Nina.

- Mágica! – respondeu Marina, com um sorriso maior ainda.

Quando Nina chegou a sua casa, sequer almoçou, foi direto para o seu quarto, que mantinha a mesma desarrumação de quando saiu de manhã. Não se importou em arrumar ao menos a cama, apenas se deitou e fitava o teto, relembrando. Estava sozinha, e não precisaria se preocupar em organizar nada antes das dezessete horas, como em todos os outros dias. E não se preocupou mesmo. Passou a tarde inteira “vegetando” em seu quarto, enquanto tentava não se esquecer de nenhum detalhe do que havia acontecido mais cedo.

Deu o horário de Nina buscar Renata na creche. Ela que nunca se arrumava direito pra ir buscar a irmã, naquela tarde, se produziu mais, talvez por saber que poderia encontrar Lucas, talvez apenas por estar mais feliz. Independente dos motivos, ela não o viu. O fim do dia seguiu na rotina de costume: Marina cuidando de Renata até que seus pais chegassem do trabalho, depois comer alguma coisa e dormir. Marina odiava fazer isso todos os dias, nunca havia nada de diferente. A parte do dia que mais gostava era, até então, ficar sozinha a tarde inteira – onde poderia fazer o que quisesse sem ter que dar satisfações ou prestar obediência a ninguém, apenas precisava não se atrasar ao buscar a irmã, que era onde “acabava a festa” -, mas a partir daquele dia, ela estava começando a ver o colégio como uma de suas partes favoritas do dia. Aquela quinta-feira de março acabava, e Marina estava ansiosa pelo próximo dia, onde veria Lucas. Como ficaria tal situação?

Marina acordou cedo, e a rotina recomeçava. Algumas vezes, enquanto ia para o colégio, ela via Lucas indo também, há alguns metros de distancia à frente, ela nunca chegou mais perto, a timidez não deixava, mas dessa vez que ela queria vê-lo, não viu. Frustrante, teria que esperar pelo colégio mesmo. Chegando lá, Nina procurou com um olhar, mas não o viu. Onde estava Lucas? Pelo menos havia encontrado Patrícia. Ela precisava contar pra alguém...

- Paty, Paty...

- Oi Nina! – respondeu ela.

- Eu preci... Não, esquece. – Nina hesitou em falar.

- O quê? Começou, agora fala. – Patrícia estava curiosa.

- Não, nada. Nada. – a vergonha falou mais alto. Como ela contaria? “Oi, eu fiquei com o Lucas ontem!” definitivamente não era uma boa idéia. Ia parecer vulgar, uma “Viviane” da vida. E isso era o que Marina não queria de jeito nenhum.

O sinal tocou anunciando a entrada nas salas, e elas se encaminharam para as mesmas. Marina procurando por Lucas, que não havia chegado ainda. A primeira aula já estava começando e nada de ele aparecer. Marina estava aflita, ela precisava vê-lo. Cinqüenta minutos inteiros de aflição se passaram, até que o sinal tocasse novamente anunciando o início da segunda aula, que naquele dia, era Educação Física. A primeira aula havia sido Física, e como em sempre em todas as aulas com o professor Airton, os alunos ficavam fora de sala, Marina e Patrícia, e mais algumas outras garotas da classe, estavam sentadas em um banco no pátio do colégio, em frente à quadra e perto do portão de entrada. Assim que o sinal tocou, alguns alunos que haviam chegado atrasados entraram no colégio, e entre eles Lucas. Os olhos de Marina brilharam ao vê-lo, mas ele passou por ela sem vê-la, e foi direto para o campo de areia, que ficava na parte posterior do colégio, onde seria a aula. Marina apenas o seguiu com os olhos e chamou as meninas que estavam com ela para irem para a aula. Elas chegaram com uns cinco minutos de atraso, e o professor já havia dado início às atividades, que naquele dia era uma corrida de resistência. Marina não participava das aulas de Educação Física, e ficou apenas observando os colegas de turma correndo. Lucas corria bem mais que os outros, parecia ter o fôlego de um atleta. Em nenhum momento ele olhou pra ela.

Durante a aula, Nina começou a pensar que não deveria ter deixado acontecer nada entre eles, que ela havia fantasiado coisas onde não existia nada, que o Lucas que ela quis não existia.... Mil coisas passaram por sua cabeça. Ela estava confusa, Lucas era um menino com atitudes sempre estranhas. Quinze minutos antes de acabar a aula, o professor encerrou a corrida e liberou os alunos para descansarem e se reidratarem – fazia muito calor, apesar de ser bem cedo da manhã ainda – e Marina estava sentada perto do professor, quando Lucas passou por ela. Ela se levantou, aproximou-se dele e disse:

- Nem oi? – o tom era de desapontamento.

- Ah, desculpa. Agora eu to suado... Depois, ta? – ele respondeu, mostrando o rosto suado, e indo procurar a torneira mais próxima.

- Ta... – Marina respondeu, mas ele já estava longe pra ouvi-la.

Ele estava bem suado, mas ela não se importaria. Lucas definitivamente era um menino estranho. Suas atitudes eram as mais diferentes possíveis a cada dia, e isso deixava Nina extremamente confusa em relação ao que esperar dele.

A terceira aula passou rápida, e Marina em nenhum momento falou com Lucas. Ela não sabia qual era a definição de “depois” dele, já que ele também não tinha ido falar com ela. Patrícia, como sempre, perguntou à Marina sobre Lucas.

- E o Lucas, hein? – ela provocou.

- Ta ali... – Marina soou indiferente,

- Eu sei, boba. Mas e vocês dois?

- Acho que não vai dar em mais nada. – ela deixou escapar.

- Como assim, “mais nada”? – Patrícia era muito perceptiva.

- Ops! Não, não, não... Esquece. – Nina tentou.

- Nada disso! Me conta tu-do! O que aconteceu?

- Não Paty, esquece.

- Pode ir falando Nina!

- Ta, ok. É que ontem, quando a gente tava indo embora...

- O quê? O quê?

- Ele... me beijou. – Nina ficou vermelha.

- Sério? Ai, que lindinho.

- Mas acho que vai ficar por isso mesmo. – ela estava desapontada.

Era a hora do intervalo, e Marina e Patrícia ficaram, como de costume, andando pelo colégio. Lucas estava parado com alguns amigos, em um ponto onde podia ver Nina se estivesse andando ou parada, como fazia de vez em quando com algumas amigas. Nina passou por ele várias vezes, e cada vez que eles se viam, ele mandava um beijo pra ela, ou sorria, ou fazia qualquer outro sinal, mas apenas isso. Nina parou para conversar com Andressa, ficando de costas pra Lucas. Andressa, que viu os dois juntos disse:

- Aquele menino ta olhando pra cá.

- Qual? – Nina se fez de desentendida.

- Não se faça de monga! Você sabe de quem eu to falando...

- Ah, o Lucas.

- Esse mesmo. Ele ta olhando pra você, vai lá com ele.

- Não, capaz. Ele ta lá, rodeado dos amigos dele, imagine eu lá? Jamais. Se ele quiser, ele que venha. Eu não vou correr atrás.

- Você que sabe.

Marina não foi falar com ele, nem ele com ela. Cada um esperando a decisão do outro. Mas os gestos continuaram pelo resto do intervalo. O sinal tocou novamente, e Marina foi para a sala. Lucas não entrou na aula, e ela não o viu mais no colégio. Onde ele estava?

Lucas havia ido embora mais cedo, aparentemente sem nenhum motivo. Marina ficou muito desapontada com o desleixo dele, e sentia que tinha agido errado ao ter beijado-o, mas o quê mais ela podia fazer? Ela se sentia atraída por ele, queria estar perto dele, e quando ele demonstrou algum interesse, ela não podia simplesmente ignorar, e se ele desistisse? Ela jamais se perdoaria. Mas agora já estava feito, não tinha mais volta. Era inevitável pensar nele, fantasiar mil coisas, várias outras situações... E pra ajudar, era sexta-feira, o que significava que ela só o veria dali a 2 dias (e meio). Ou não.

Naquela semana havia sido aniversário de uma prima de Renata, filha da tal tia que morava no mesmo caminho que Lucas, e Marina e o resto da família (leia-se: mãe, padrasto e irmã) foram até a casa dela, onde teria uma pequena (pequena mesmo!) comemoração, no domingo. Fazia sol, e estava calor, e como a casa era bem perto, eles resolveram não ir de carro, e foram caminhando. Para chegar lá, havia dois caminhos: um pela esquerda, que era o caminho que Lucas seguia quando voltava do colégio com Marina; e outro pela direita, que era pela avenida que Lucas disse que morava perto. Eles escolheram ir pela direita, que parecia ser mais perto. Seguiram a tal avenida, e chegaram a uma esquina, que era a rua da casa que estavam indo. Nessa esquina havia uma lanchonete, e tamanha foi a surpresa de Marina ao virar aquela esquina. A lanchonete estava aberta, havia uma mesa com cadeiras do lado de fora, e em uma dessas cadeiras, Lucas estava sentado. Ele usava uma camiseta amarela, calça preta, boné branco e óculos escuros, e viu Marina. Ela estava passando ali com a mãe, e não podia parar pra falar com ele, caso fizesse isso, provavelmente teria que responder a uma série de perguntas de sua mãe, coisa que não queria. A mãe de Marina, Amélia, era muito desconfiada, e implicava com tudo que a filha fazia, e tinha uma idéia formada sobre garotos, e não queria a filha tão cedo com eles, até as amizades de Marina, ela não gostava muito da idéia de amigos – amigos, masculino.

Marina não conseguiu disfarçar a sensação de ver Lucas, e passou por ali com os olhos fixos nele, retribuindo ao sorriso que ele lhe deu enquanto ela passava. Ele estava ali, tão perto, e ela sem poder parar pra falar com ele. A casa da tia de Renata, Salete, ficava a cinco casas da esquina da lanchonete, mas do outro lado da rua, e não demorou mais que um minuto e meio para chegar lá. Nina estava claramente distraída, e não prestava atenção em praticamente nada ao seu redor, a única imagem na sua cabeça era a de Lucas sentado naquela cadeira em frente à lanchonete, sorrindo pra ela.

O aniversário era de Amanda, uma menininha que estava completando 8 anos. Apesar de não ser mais tão pequena, ainda teimava em fazer de Nina uma boneca gigante – sempre que Nina estava lá, ela tinha que brincar com Amanda de tudo que ela quisesse – ela era uma menina muito mimada. Naquele dia, Amanda estava ainda mais pegajosa, e Nina não podia fazer nada, por mais que estivesse em outro planeta – mais precisamente, o “planeta Lucas” -, afinal era aniversário dela. Para amenizar um pouco a situação – ou não –, Nina chamou Amanda para ficar na varanda na frente da casa, onde, estrategicamente, ela teria uma visão da rua. Coincidência ou não, Lucas não estava mais na frente da lanchonete, e sim andando de bicicleta pela rua, consequentemente, sempre à vista de Marina.

Nina tentou, de forma discreta, ver se ele entrava em alguma casa, para saber onde ele morava, mas não viu nada. Não demorou muito, e ela teve que entrar na casa, pois já estava anoitecendo, e ela não viu mais Lucas. Eles cantaram parabéns, ficaram um pouco mais por lá, e foram embora, afinal já estava tarde e eles teriam que ir caminhando.

Quando eles estavam indo para casa, eles não voltaram pela avenida, e Nina ficou um pouco desapontada, pois não passaria pelo mesmo lugar onde havia visto Lucas. A volta demorou um pouco mais, e Nina chegou em casa um tanto quanto cansada. Ela resolveu tomar um banho, pra relaxar um pouco, pegou um pijama na gaveta e foi para o banho. Apesar de ter sido um dia com bastante calor, a noite estava um pouco mais fria, e ela deixou a água quente escorrendo por suas costas. Marina demorou mais que o tempo necessário com o seu banho, e só saiu quando sua mãe começou a reclamar.

Ela se vestiu e se preparou para dormir, não estava tão tarde, mas ela havia tido um dia longo, e também, teria aula logo pela manhã, precisava descansar. Ela deitou em sua cama, mas não conseguia dormir, e começou a fitar as estrelas que havia em seu teto, daquelas que brilham no escuro. Não é difícil adivinhar em que ela pensava: Lucas, como sempre. Ela não conseguia entender como ele podia agir de forma tão diferente com ela cada vez que a via. Era como se existissem dois Lucas: um que gostava dela e outro que nem a conhecia. Mas ela já estava envolvida demais para sequer se afastar dele, e se caso realmente existisse esse Lucas que não a conhecia, ela iria fazê-lo conhecê-la e gostar dela, assim como o outro Lucas. Assim que ela chegou a essa conclusão, percebeu que já estava ficando maluca. “Dois Lucas? Sinceramente, Marina, é hora de dormir!”, pensou ela. E naquela noite, foi a primeira vez que ela sonhou com ele enquanto estava dormindo. No sonho, eles estavam juntos e felizes, em lugar muito bonito, que Marina não conhecia. Caminhavam de mãos dadas por um caminho de pedras, cercado por uma grama muito verde e tulipas vermelhas, uma paisagem que lembrava muito a Holanda. De repente, Lucas parou e Marina continuou andando uns dois passos à frente, e quando ela se virou para trás para vê-lo, ele não estava mais lá. Ela se virou para frente novamente, a paisagem havia sumido. Ela olhou ao redor, e ela estava sozinha. Havia apenas ela no meio do nada. Marina acordou assustada.

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